sábado, 25 de junho de 2011

Vegetarianismo nas religiões- Parte 1 : Religiões indianas ou védicas

Introdução.

Este é um blog cristão. Sem abrir mão da doutrina de Cristo como mediador e caminho para Deus, reconhece, contudo, expressões da verdade em crenças não vinculadas ao cristianismo.

Esta ideia, da veracidade de determinados elementos doutrinários e práticos em crenças tão distantes da tradição judaico-cristã, não é nova. Também não é fruto da cabeça de algum " liberal relativista", de acordo com a concepção tacanha de alguns fundamentalistas.

No período da Reforma, Zwínglio, o reformador suíço, recorrendo ao pensamento de teólogos patrísticos como Justino e Orígenes, afirmou que, na antiguidade, a salvação e a verdade não se encontravam sob posse exclusiva do povo hebreu, mas estendiam-se, de acordo com a soberania divina, para vários povos. Como argumento decisivo, o reformador de Zurique citava a sublimidade existente na filosofia grega.

Já no século XX, esse conceito foi defendido por teólogos de diferentes matizes. Karl Rahner, importante teólogo católico suíço, defendia essa tese. C.S.Lewis, pensador anglicano de orientação evangelical, também partilhava tal pressuposto.

Portanto, como cristãos, temos muito a aprender com outras crenças. O mesmo vale para com o ateísmo e agnosticismo. Deus é soberano e fala de diferentes maneiras.

Feita esta pequena introdução, estou inaugurando uma seqüência histórica a respeito do vegetarianismo em diferentes crenças. Contudo, gostaria de deixar uma coisa bastante clara. Não pretendo dogmatizar o vegetarianismo. Sou vegetariano há cerca de um ano. Foi uma escolha pessoal, sem nenhuma ligação com minha fé cristã evangélica. Se fosse ateu, também seria vegetariano.

A série será inaugurada avaliando o vegetarianismo nas chamadas religiões védicas, caso do hinduísmo, jainismo e budismo.

Autor da Introdução : André Tadeu de Oliveira


O presente artigo foi retirado do site hindu Mokshadharma

http://mokshadharma.blogspot.com/2008/10/psicologia-indiana.html


Vegetarianismo Hindu e o Ayurveda


Preceitos éticos levaram à introdução do vegetarianismo em algumas religiões da antiga Índia e estabeleceram os fundamentos de uma autêntica prática religiosa(Hinduism, Jainism and Buddhism). No jainismo o vegetarianismo é uma imposição, no hinduísmo e no budismo mahayana é proposto por textos relevantes. Em contraste, nas religiões abraâmicas (judaísmo, cristianismo e islamismo) e no sikhismo o vegetarianismo não é uma prática oficial. Entretanto, no cristianismo e no sikhismo alguns segmentos promovem o vegetarianismo como disciplina religiosa.

Hinduísmo

O vegetarianismo tem um papel importante na tradição hindu, embora existam diversas variedades de práticas e crenças que se transformaram ao longo do tempo. Estima-se que cerca de 30% dos hindus são vegetarianos. Entretanto, algumas seitas hindus não observam o vegetarianismo.




Não Violência

O princípio da não-violência (ahimsa) foi introduzido pelo budismo e pelo jainismo como reação às práticas sacrificiais de animais e humanos existentes no primitivo brahmanismo. Acredita-se que o sofrimento de todos os seres resulta das ambições e desejos e condicionam efeitos kármicos. A violência no abate de animais para alimentação é fruto do desejo e comer carne condena os seres humanos ao sofrimento.

O Hinduísmo incrimina os responsáveis pelo abate animal, os que matam e os que o retalham, os que vendem e os que compram, quem cozinha, quem serve, e quem o come devem ser considerados assassinos do animal. As questões que envolvem os deveres religiosos e do Karma negativo gerado pela violência (himsa) contra animais é discutida em pormenor nas escrituras hindus e nos textos religiosos normativos.

Segundo as escrituras hindus do período védico (que perdurou até cerca de 500 AC), em princípio, era permitido comer carne, mas houve uma restrição específica nas regras. Várias escrituras respeitáveis proibiram a matança de animais domésticos, exceto no caso do sacrifício ritual. Preceito claramente expresso no Mahabharata (3.199.11-12; 13,115; 13.116.26; 13.148.17), no Bhagavata Purana (11.5.13-14), e nos Chandogya Upanishad (8.15.1). Também se encontra no Manu Smriti (5.27-44), a renomada obra jurídica hindu (Dharmasastra). Estes textos condenaram veementemente o abate de animais e o consumo da carne, a menos que ocorressem no contexto dos sacrifícios rituais executados pelos brahmanes. O Mahabharata permite aos guerreiros profissionais (Kshatriyas) caçar e comer carne "para adquir força e coragem" (13.115.59-60; 13.116.15-18), mas se opõe a essas atividades, no caso de samnyasins (renunciantes) que devem ser rigorosamente não-violentos.

O Mahabharata (12,260; 13,115-116; 14,28) e o Manu Smriti (5.27-55) contêm longos discursos sobre a legitimidade do abate ritual e do conseqüente consumo de carne. No Mahabharata ambos, os carnívoros e os vegetarianos apresentam diferentes argumentos para fundamentar os seus pontos de vista. Estes textos mostram que tanto o abate ritual e a caça foram contestados por defensores da não-violência, tema polêmico de difícil aceitação. No hinduísmo moderno o abate ritual permitido nas escrituras védicas praticamente desapareceu.

Aspectos Espirituais

Em algumas tradições, especialmente no Vaishnavismo, é essencial que os devotos ofereçam o alimento à divindade escolhida antes de comê-lo como Prasad. Esta regra é rigorosamente observada pelos discípulos do Bhakti Yoga, especialmente os Gaudiya Vaisnavas. Adoram Vishnu ou Krishna, e de acordo com as injunções das escrituras que obedecem, apenas a comida vegetariana é aceitável como Prasad.

O vegetarianismo é compulsório também para os praticantes de Hatha Yoga. Os preceitos das escrituras como o Bhagavad Gita orientam para comer apenas alimentos de alta qualidade, porque o alimento modela a personalidade, o caráter e a mente. O consumo da carne induz à confusão mental e à ignorância, e ao indesejável estado mental conhecido como Tamas, enquanto uma dieta vegetariana promove as qualidades satvicas essenciais para progresso espiritual.


Budismo

O primeiro preceito do budismo proíbe não matar, ao contrário, o mandamento bíblico (Não Matarás) se aplica apenas aos seres humanos. O primeiro preceito sempre foi aplicado tanto aos animais como aos seres humanos implicando o não consumo de carne pelos budistas. Em alguns sutras Buda condena energicamente a ingestão de carne. No Mahayana Mahaparinirvana Sutra, Buda afirma que "comer carne destroi a semente da grande compaixão", acrescentando que o consumo de todo e qualquer tipo de carne ou peixe é uma contravenção, o consumo de carne é incompatível com a grande compaixão e estabelece o vegetarianismo como o correto sistema alimentar. Buddhist vegetarianism


O Ayurveda e a alimentação vegetariana

O Ayurveda reconhece o poder da alimentação e dos hábitos alimentares na restauração e preservação da saúde. Caraka (300 AC), renomado médico da antiga Índia, afirma que alimento é vida.

Textos antigos extraídos do Ayurveda estão repletos de exemplos relevantes de curas de doenças através da alimentação, bem como da manutenção da saúde. Eles priorizam a alimentação vegetariana que é considerada sátvica - a melhor forma para o consumo humano entre as três categorias ou qualidades (guna), as outras duas são a rajásica e a tamásica em ordem decrescente de qualidade.

O consumo regular de alimentos sátvicos previne doenças, promove melhor saúde física, mental e espiritual. De acordo com o Ayurveda, consumir alimentos sátvicos e adotar uma forma de vida sátvica é a melhor medicina preventiva.


Alimentos sátvicos, Rajásicos e tamásicos

A alimentação sátvica é a vegetariana orgânica que é natural e revigorante. Abrange frutas frescas e legumes, cereais, pães integrais, nozes, sementes e saladas. Alimentos que têm um sabor naturalmente doce são sátvicos, mas não inclui produtos com açúcar refinado, refere-se a qualquer coisa que tem um gosto doce sem aditivos químicos, como os cereais (arroz, trigo e cevada), pães, mel e frutas. Também estão incluídos neste grupo leite, chás, sucos de frutas ou de vegetais orgânicos e água. Alimentos cultivados organicamente são os preferíveis e, fertilizantes, pesticidas, produtos químicos e conservantes são tamásicos. Cogumelos, cebola, alho e o uso excessivo de especiarias devem ser evitados, pois são rajásicos e/ou tamásicos. Álcool, produtos que contêm cafeína (café, chocolate, chá, cola) e carne devem eliminados da dieta.

Equívocos sobre o consumo de carne no Ayurveda

As legítimas prescrições de dietas ayurvédicas estão baseadas no vegetarianismo, entretanto, ocorreram equívocos sobre a dieta vegetariana, e do papel do vegetarianismo no Ayurveda. Alguns autores defendem o uso de carne em suas orientações dietéticas, ou asseguram que pessoas com constituição vata necessitam de proteínas de origem animal. Outros afirmam que o ayurveda baseia-se no vegetarianismo por motivos religiosos, ao invés de razões biológicas ou preocupações com a saúde.

É verdade que o consumo de carne foi incluído nos textos originais do ayurveda, Caraka declara que a carne tem valor terapêutico quando preparada e consumida em condições específicas. No entanto, isto ocorreu em circunstâncias muito diferente dos atuais métodos de produção e consumo. A carne aparece como pequena parcela da dieta total, e era obtida através dos métodos tradicionais de caça em ambiente natural onde os animais viviam em seu habitat natural.

Caraka estabeleceu as diretrizes para o correto consumo de vegetais e de produtos animais, incluindo as características dos animais que não devem ser consumidos. Além disso, Caraka não recomenda o consumo habitual de carne como se propaga frequentemente. Pelo contrário, Caraka afirma que a carne tem grande valor quando utilizada para tratamentos de certas doenças, para os debilitados ou convalescentes, ou nos estados de desidratação ou definhamento. Se o animal sofreu morte natural, se foi morto por outros animais ou através de envenenamento, se for muito magro, gordo, velho ou jovem, comer sua carne é prejudicial à saúde. (Sutra Caraka Samhita 37:311)

Anatomia humana e a carne

Biologicamente, os humanos são mais adaptados a uma natural dieta vegetariana, pois seus dentes e a mandíbulas não são adequados para a dieta carnívora. Pesquisadores da Universidade do Arkansas e da John Hopkins School of Medicine dedicaram anos de estudo na análise do formato e dos padrões de desgaste dos dentes humanos confrontando as correspondentes dietas de primatas e de nossos fossilizados antepassados. Dentes com cúspides moderadamente acentuadas, como os nossos, só foram utilizados para o corte de alimentos como frutas, nozes, brotos, folhas e flores.
Os carnívoros têm características biológicas estruturalmente diferentes dos herbívoros. Seus intestinos são curtos e os ácidos digestivos são muito fortes, enquanto o comprimento do intestino humano é de três a quatro vezes maior do que o de um carnívoro típico, e com produção de ácidos digestivos mais fracos. A carne, por conseguinte, leva muito tempo para ser digerida, às vezes por vários dias. Nesse tempo, uma quantidade significativa de toxinas (ama) é estocada produzido o auto-envenenamento. Dr. Jenson, proeminente nutricionista norte-americano, expressa este conceito claramente quando afirma: "As proteínas animais apodrecem muito rapidamente no trato intestinal... A fermentação ocorre em condições intestinais que favorecem a multiplicação de bactérias tóxicas indesejáveis e destroem as benéficas acidophilus".




É possível obter proteínas de vegetais?

O valor da carne na dieta humana é geralmente associado ao seu conteúdo protéico. É uma falácia a difusão de que a proteína animal é essencial para a nutrição humana e que não pode ser obtida a partir de qualquer outra fonte. As proteínas necessárias para a preservação da saúde e fortalecimento do vigor físico são encontradas em uma ampla variedade de alimentos. Se a “qualidade da proteína” numa escala de avaliação entre 1-100 é aplicada a diferentes alimentos, as aves domésticas ocupam a posição 67e peixes a 80. Em contraste, o leite tem a classificado 82, grãos entre 50-70, leguminosas, nozes e sementes entre 40-60 e verduras cerca de 80. As necessidades diárias de proteínas, na verdade, são inferiores ao que se acredita.

Nos tempos modernos, os problemas com as dietas ocidentais normalmente é excesso de consumo de proteínas ao invés de sua deficiência. Muitos componentes das proteínas metabolizadas pelo corpo humano (aminoácidos) são realmente fabricados internamente. Dos 22 aminoácidos que fornecem proteínas, o corpo humano produz 13, independente das fontes dietéticas. Os restantes podem ser obtidos a partir de alimentos vegetais.
Algumas pessoas acreditam que as dietas vegetarianas são deficientes em vitaminas do complexo B, especialmente a B12. Esta vitamina é essencial na dieta, e sua deficiência pode levar à fadiga, falta de concentração, de memória e insônia. A vitamina B12 pode ser obtida pelo suficiente consumo de leite, queijo e cereais integrais. Uma variada e equilibrada dieta vegetariana evita a necessidade de quaisquer suplementos de vitaminas do grupo B.

Importância do consumo equilibrado

Proteína animal na forma de carne não é essencial para o crescimento humano e seu desenvolvimento, o ser humano pode desenvolver-se normalmente a partir do nascimento, e obter os necessários nutrientes e vivenciar completa saúde com uma dieta puramente vegetariana.

De fato, diversos estudos demonstraram que os vegetarianos têm vida mais longa, com menor incidência de câncer e maior densidade óssea do que os não-vegetarianos.
Um consumo equilibrado de vegetais, grãos, nozes, legumes e sementes fornece quantidades suficientes de proteínas, bem como de todas as vitaminas e minerais necessários para a saúde, conferindo vitalidade e energia. Há uma enorme gama de receitas vegetarianas saborosas e nutritivas, fáceis de preparar e de natureza sátvica que comprovam que a alimentação vegetariana não é apenas uma porção de vegetais e saladas cruas!

Situação atual

Na Índia moderna, os hábitos alimentares dos hindus variam de acordo com suas comunidade ou sua casta de acordo com as tradições regionais. Os hindus vegetarianos geralmente evitam ovos, mas consomem leite e produtos lácteos, assim eles são lacto-vegetarianos.

Segundo uma pesquisa de 2006, o vegetarianismo é pouco praticado no litoral, sendo mais forte no interior dos estados do norte e oeste, e especialmente entre brahmanes que contam com 55 por cento de adeptos. A maioria dos habitantes do litoral consomem peixe. Em particular, hindus do Bengali mistificaram pescadores e o consumo de pescado através da poesia, da literatura e da musica. Segundo as últimas pesquisas é crescente o consumo de carne na Índia.

5 comentários:

  1. Parabéns pela ótima explanação sobre a abstenção histórica de carne. No entanto, na parte sobre o Budismo voce diz que o mandamento bíblico do Não Matarás refere-se somente aos seres humanos, quando na verdade ele diz somente, Não Matáras. Ainda, muito bom o artigo! Vi que voce esta antenado ao debate sobre o direito animal, especismo etc. Queria conversar sobre o vegetarianismo na cristandade e novas formas de abordar esse tema tão caro, por tocar no princípio da compaixão! Meu e-mail é marcusvinicius_yuhi@hotmail.com (se puder mandar o seu). Muito Grato. Marcus.

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  2. Sou Católico, porém me tornei devoto de Krishna e acredito, como os outros Hare Krishna, no Deus único visto sob diferentes aspectos pela humanidade... venho dar os parabéns pela matéria! Todas as religiões poderiam pensar em não violência... começando no prato, é até um exercício para a não violência no dia a dia. aceite minuas reverências...Haribol!

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  3. Sou Católico, porém me tornei devoto de Krishna e acredito, como os outros Hare Krishna, no Deus único visto sob diferentes aspectos pela humanidade... venho dar os parabéns pela matéria! Todas as religiões poderiam pensar em não violência... começando no prato, é até um exercício para a não violência no dia a dia. aceite minuas reverências...Haribol!

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